sábado, 15 de junho de 2013

No Recife, quadrilha junina ousa com beijo gay em casamento matuto


Personagens levaram um susto com o convite, mas aceitaram desafio.
Relação entre dois homens foi bem aceita por público que assistiu.





Luna MarkmanDo G1 PE
nte agora
Quadrilha Tradição fez o primeiro casamento homoafetivo em um arraial. (Foto: Gabriela Lisboa/TV Globo)Rodrigo e Augusto foram os protagoniastas da Quadrilha Tradição (Foto: Gabriela Lisboa/TV Globo)
O casamento é uma das partes mais aguardadas pelo público de uma quadrilha junina. Também é o ponto alto quando a apresentação é para jurados de um concurso, e vale tudo para impressionar. Este ano, a Tradição, do Morro da Conceição, Zona Norte do Recife, escolheu ousar e polemizar, colocando um beijo gay na cena do matrimônio. A relação amorosa entre dois homens foi bem aceita desde a diretoria e dançarinos até a plateia do Festival de Quadrilhas Juninas da Globo Nordeste, no Cabo de Santo Agostinho, na Região Metropolitana, onde o grupo se apresentou, na noite da sexta-feira (14). O público aplaudiu com euforia, mostrando que o tema resistiu a uma prova de fogo.

Tudo começou quando os tipos de beijo foram escolhidos como tema. "Fui chamado para fazer o enredo e, durante as pesquisas, vi que como o beijo é universal, até padre beija mão dos fiéis, e pensei: será que só heteros têm direito a beijar? Como é um assunto pesado, tratei tudo de uma forma poética, sem ser vulgar, para passar essa imagem de que pessoas do mesmo sexo também podem se amar", explicou Anderson Abreu, dramaturgo e diretor teatral da Tradição.

A saga de Severino "Boca Virgem"
A quadrilha contou a história de Severino "Boca Virgem", filho de mãe protestante e coronel 'brabo'. A família morava em uma cidade de interior cuja igreja queria arrecadar dinheiro para uma reforma, e o padre inventou a barraca do beijo. Como já corriam rumores que Severino era homossexual, a mãe disse que o primeiro bilhete seria do filho, que acabou sendo premiado: ele poderia experimentar todos os tipos de beijo.
Anderson montou enredo da quadrilha. (Foto: Luna Markman/ G1)Anderson criou enredo da quadrilha. (Foto: Luna Markman/ G1)
Nessa jornada de experiências, o jovem não se encanta por ninguém, mas a mãe, preocupada com a opinião da sociedade, diz que ele tem que sair casado até o final da festa de São João. As mulheres entram em uma batalha de danças para impressionar o rapaz, que até escolhe uma delas. Mas na hora do casamento, entra em cena o vendedor de flores Frederico, um cara por quem Severino estava intimamente encantado.
Nessa hora, as luzes se apagam e uma juíza pergunta se o noivo está pronto para selar o matrimônio com Frederico, virando a história. Pai, mãe e pastor são contra, ameaçando Severino até de morte. A cena congela e aparecem sombrinhas com interrogações. "Fizemos isso para instigar o público e a comissão julgadora a se questionarem sobre o que seria o correto. Agressão aos homossexuais como vemos nas escolas, ruas e praças? Então, mostramos que essa história pode ter um final diferente, e a família aceita a relação do filho com outro homem", conta Anderson.

Personagem real
Como a vida muitas vezes imita a arte, Rodrigo Motta, o Severino da quadrilha, também encontrou resistência da família por sua opção sexual. "Foi um choque para minha mãe quando disse que era gay, mas ela aceitou logo, porque é cabeça aberta, convivia já com a quadrilha. Mas meu pai, que é protestante, ainda acha que isso é coisa do demônio. Ainda bem que na rua, nunca foram agressivos comigo, só escuto gracinha vez ou outra", falou.
Rodrigo e Augusto toparam desafio. (Foto: Luna Markman/ G1)Rodrigo e Augusto toparam desafio. (Foto: Luna Markman/ G1)
Rodrigo e Augusto Neves, o Frederico da quadrilha, contam que levaram um susto quando foram convidados para os papéis. "Foi uma surpresa, pois geralmente o casamento é aquele tradicional, homem e mulher, e vieram com essa proposta nova. Pensei: 'seja o que Deus quiser'. Sabia que uns iriam gostar, outros não, mas também sabia que o público que gosta de quadrilha não tem preconceito. Então, fiquei satisfeito de encarar esse projeto", comentou. Augusto também é homossexual, mas relata que sempre contou com apoio da família.
Apoio foi a palavra-chave para a Tradição ir em frente com a ideia do beijo gay. "Temos 120 pessoas, entre dançarinos e personagens do casamento, e a maioria dos homens é homossexual, então todo mundo ficou satisfeito com a proposta deste ano. Nunca soubemos de beijo gay em quadrilha nenhuma do Brasil", disse Tádzio Estevam, diretor de comunicação da quadrilha e dançarino.
Quadrilha tradição se apresntou na 4ª noite do Festival de Quadrilhas Juninas da Globo NE. (Foto: Gabriela Lisboa/TV Globo)Quadrilha Tradição se apresentou na 4ª noite do Festival de Quadrilhas Juninas da Globo Nordeste
(Foto: Gabriela Lisboa/TV Globo)

0 comentários:

Postar um comentário